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Alfa 2300: inovação, luxo, exclusividade e desempenho, marcaram o último alfa brasileiro


JORNAL DO GUMA
Série Alfa 2300
Texto e fotos: Gustavo Carvalho de Barros

Avaré tem um dos raros exemplares do Alfa, muito bem cuidado, de propriedade de Gustavo Carvalho

Em meados de 1970, a FNM, localizada em Xerém, distrito de Duque de Caxias-RJ, comandada pela própria Alfa Romeo desde 1968, decide iniciar um novo projeto para substituir o Alfa 2150 (JK), produzido desde 1960 e considerado referência em avanço. O JK foi o primeiro carro brasileiro com câmbio de 5 marchas, duplo comando de válvulas no cabeçote e pneus radiais de série. Contrapondo aos enormes carros de origem americana da época, o JK tinha um apelo mais esportivo, maior estabilidade e ronco empolgante, afinal tratava-se de um legítimo Alfa Romeo. Paralelamente às suas características esportivas, ele se apresentava como uma opção de carro luxuoso e exclusivo, pois custava muito caro e o preço o colocava num patamar de “carro de sonho” para a maioria dos pobres brasileiros. Assim, em 1972, sua produção seria encerrada e daria lugar a um novo projeto desenvolvido pela FNM.
O Alfa de Gustavo fica em exposição no Museu do Automóvel de Avaré

O substituto, identificado como projeto 144, já vinha sendo testado em terras italianas e suas linhas foram inspiradas na novíssima Alfetta. Muitas revistas italianas da época retratavam o carro como um novo Alfa Romeo, mas poucos sabiam que seria um projeto exclusivo para o mercado brasileiro.

Em março de 1974, a FNM apresentava o Alfa 2300, um carro totalmente novo, com linhas mais sóbrias, sem deixar de lado sua vocação esportiva. O motor, de 2.310 cm3, 4 cilindros e torque de 21 mKgf, era uma evolução do motor do Alfa 2150 brasileiro. Além disso, seu nome evocava um dos mais famosos Alfas do passado, o Alfa 8C 2300 dos anos 30. Esse motor debitava 140 cv e levava o carro à máxima de 170 Km/h e aceleração de 0-100Km/h em apenas 11,7 segundos, marcas empolgantes para um modelo que não tinha pretensões exclusivamente esportivas.

Haviam avanços significativos na mecânica, como válvulas de escapamento refrigeradas à sódio (um requinte que a Alfa Romeo buscou em sua experiência aeronáutica), freios a disco nas quatro rodas, câmaras de combustão hemisféricas e eixo de manivelas apoiado em cinco mancais. Realmente, um carro que marcava nossa indústria pela alta tecnologia embargada.


Interiormente, o Alfa 2300 trazia painel completo, condizente com sua categoria. Mostradores redondos, luzes-espia e volante de alumínio com acabamento em madeira, convidavam a uma tocada mais esportiva. Opcionalmente, apenas ar condicionado e console central onde vinham o rádio 3 faixas e relógio de horas. Bancos reclináveis com acabamento em courvim, completavam o luxo interior. Interessante ressaltar o contraste que a fábrica adotava nos carros, pois quando sua cor externa era escura o estofamento era em tom creme. Já quando as cores eram mais claras, o interior era em preto. Espaçoso, o interior acomodava confortavelmente 5 pessoas adultas e o porta-malas não fazia feio, com proporções condizentes com o padrão do carro, levava 600 litros.


A primeira atualização aconteceria no modelo 1977, com novas versões e novos acabamentos. Neste ano, a Alfa Romeo lançava a versão TI (turismo internacional) e a B, mais simples. O Alfa 2300 TI recebia aprimoramentos mecânicos que lhe conferia ainda maior esportividade. Novo painel, mais completo, agora retangular, novos acabamentos internos em tecidos nobres e bancos mais confortáveis. Mas o principal diferencial eram seus carburadores italianos Solex 40 ADDHE 12 duplos que lhe conferiam mais 9 cv de potência e adicionais 3 mKgf. Seu desempenho concorria com os carros esportivos da época, como Dodge Charger RT, Maverick GT que tinham motores V8, assim como o Opala 6 cilindros, mas ganhava em consumo por ser um 4 cilindros. A velocidade máxima do Alfa 2300 TI era de 175 Km/h e aceleração 0-100Km/h de 10,8 segundos. Uma performance respeitável até para os padrões atuais, visto que se tratava de um carro pesado, com aproximadamente 1.400 Kg.

Externamente, os modelos TI e B, traziam novas maçanetas, agora embutidas e mais aerodinâmicas, novos pára-choques, mais envolventes e volante de direção regulável em altura (uma exclusividade).


O TI apresentava ainda pára-choques pintados em preto fosco, com lanternas dianteiras embutidas, assim como dois frisos de cada lado na grade dianteira, o que conferia uma aparência mais agressiva. Para fechar, este modelo era agraciado com o trevo de quatro folhas (quadrifoglio) que ornamentava as colunas traseiras. Esse símbolo somente era adotado pelos carros de topo da marca italiana, por isso a exclusividade, desempenho e imponência da versão TI.

Em 1978, poucas mudanças nos modelos. A principal novidade é o lançamento da versão para exportação, chamada de “Alfa 2300 Rio”, que trazia motor com maior taxa de compressão e consequentemente mais potência, superando os 160 cv. Infelizmente, esse motor não equipou os modelos que aqui ficaram. Esse carro seria vendido na Alemanha e por problemas na exportação, os Alfas 2300 Rio tiveram sua produção paralisada e poucos modelos foram vendidos no exterior.


Alfa 2300TI 4


Ainda em 1978, a marca Alfa Romeo decide deixar o cenário nacional e passa o controle da sua fábrica para a Fiat Automóveis S.A., a qual assume a produção do Alfa 2300. Com isso, gradativamente a Fiat começa a transferir a linha de produção do carro para sua unidade em Betim-MG.

Em 1980, já totalmente montado em Betim, o modelo passa a ser denominado de Alfa TI-4 e a versão B sai de linha, sendo agora chamada de SL (Super Luxo), mas a versão TI-4 continua sendo a mais vendida. Neste ano, os modelos recebem a direção hidráulica progressiva de série, desenvolvida pela ZF, o que confere aos carros maior segurança e conforto.

Em 1982, novas mudanças. A versão SL deixa de ser produzida, dando lugar ao modelo à álcool, chamado de “Álcool TI”. Assim, juntamente com a versão TI-4 os carros ganham ignição transistorizada, novo cabeçote, com maior taxa de compressão (passa de 7,6 para 7,9) e novo diferencial mais silencioso, desenvolvido pela Albarus brasileira. Assim, o Alfa 2300 continua sua saga, agora com mais vitalidade para enfrentar a concorrência que vem mudando, pois já não existem mais os Dodge e Maverick, mas o Ford Del Rey, lançado em 1981 começava a incomodar.

No ano seguinte, o Landau deixa de ser produzido e o 2300 fica como única referência nacional em carro de luxo. Assim, aproveitando a oportunidade, a Fiat resolve investir alto para dotar o 2300 de mais luxo e sofisticação. E consegue incorporar ao modelo itens de prestígio pouco comuns em carros nacionais. Então o Alfa TI-4 ganha acionamento elétrico para os vidros das quatro portas, trava central elétrica comandada pelas portas dianteiras, retrovisores elétricos com comandos localizados na porta do motorista. Abertura elétrica para o porta-malas e bocal de abastecimento, com comandos no painel, relógio digital de horas no teto entre os pára-sóis, iluminação com temporizador, novas rodas com calotas de plástico e novo aplique com o trevo de quatro folhas nas colunas traseiras. Um pacote de equipamentos invejável que conferia ao modelo extrema personalidade e nobreza. O preço? Bom, com isso ele se torna disparado o carro de série mais caro do Brasil. Com seu valor, poderiam ser comprados 5 Fuscas 0Km, ou 2 Opalas Comodoro 0Km!!! Porém, a realidade é outra, a esse preço a produção do modelo é mínima, atingindo pouco mais de 700 unidades em 1983. Infelizmente, o 2300 já parece sentir o peso dos anos.

Em 1984, entretanto, começam os boatos que a Fiat iria substituir o modelo por outro mais atual, baseado no italiano Alfa 90, mas o ano vai passando e nenhuma novidade. Seu público-alvo começa a migrar para outros modelos, sobretudo o Opala. Eis que no final do ano, a Fiat apresenta um 2300 revitalizado e não um modelo totalmente novo. A fábrica alega que procurou concentrar suas atenções no lançamento do Uno e que mudanças no seu top line ficaram adiadas.

Então, como último suspiro, o modelo 1985 ganha novos pára-choques mais envolventes, uma tendência na época, com polainas de plástico, nova grade dianteira com perfis horizontais, novos faróis, agora sem molduras, novos cuore dianteiro e emblema maior, acompanhando o padrão adotado nos modelos italianos, novas lanternas traseiras maiores e novas cores da carroceria: preto etna, marrom veneto (metálica), azul itapoã (metálica), verde saquarema (metálica) e cinza argento (metálica). No interior, novas forrações dos bancos e um novo volante, com o emblema da marca, agora colorido. Essas mudanças dividiam opiniões, uns achavam que o modelo ficou “carregado”, já outros consideraram que o carro ficou mais atual para enfrentar a concorrência que estava muito acirrada, agora brigando também com o Volkswagen Santana CD, recém lançado e já um grande sucesso.


Para 1986, poucas mudanças internas e externas, com novas padronagens e desenhos dos bancos. Seu triste fim parece próximo. A fabricação despenca para menos de 260 unidades no ano e seu custo de produção atinge níveis estratosféricos, fazendo com que a Fiat decida encerrar sua produção em novembro de 1986. Alguns modelos deixariam a fábrica posteriormente a essa data, o que inflamou muitas histórias sobre alguns modelos 1987. Essa possível lenda foi confirmada há pouco tempo pelo amigo Renato Cunha, de Porto Alegre-RS, idealizador do grupo Alfa Romeo BR. Ele localizou a última Alfa 2300 produzida, uma 1987, em Farroupilha-RS, de propriedade de um descendente de italianos e, ela continua impecável!!!!


Com o fim das 2300, encerrou-se um período de 35 anos de produção nacional de carros e caminhões Alfa Romeo, restando a nós brasileiros preservarmos os veículos e difundirmos sua rica história.

Curiosamente, ainda em 1986, a Fiat adquiriu a marca Alfa Romeo na itália e passou a controlar mundialmente a empresa.

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